Não há água nas torneiras”, diz moradora do Acre; escassez hídrica coloca municípios amazônicos em estado de emergência 

Segunda pior estiagem em 13 anos é explicada pela combinação do El Niño e aquecimento do Atlântico

e 2023 – A administração Oceânica e Atmosférica Americana (NOAA) atualizou em março de 2023 suas previsões, indicando 90% a chance do fenômeno El Niño ocorrer com forte intensidade no segundo semestre do ano. Para a Amazônia, isso significou uma temporada de seca, altas temperaturas e riscos de incêndios florestais e cenários devastadores. Não à toa, aumentou para 17 o número de municípios em situação de emergência hídrica e 38 em alerta, segundo informações do Secretário, Francisco Maximo, da Defesa Civil.

Em entrevista concedida na última quinta-feira (21) para a TV local, o político afirmou que 100 mil pessoas são afetadas diariamente pela estiagem. Na calha do Alto Solimões, estão em situação de emergência os municípios de Benjamin Constant, Amaturá, São Paulo de Olivença e Santo Antônio do Içá; na calha do Juruá, estão Ipixuna, Envira, Itamarati e Eirunepé; e no Médio Solimões, a estiagem severa atinge Coari, Tefé, Jutaí e Uarini. 

A descida da água é considerada “normal” em apenas três cidades. Segundo especialistas, o desenvolvimento do El Niño levará a um novo pico no aquecimento global e aumentará a chance de quebrar recordes de temperatura. Para remediar a situação, no dia 12 de setembro, o Governo do Amazonas lançou a Operação Estiagem 2023 e anunciou ações de emergência aos municípios afetados. O cenário não é nada animador, a previsão é de estiagem para os próximos meses, atrasando o início do período chuvoso, que acontece em outubro. 

Fernando Silva, sócio fundador da PWTech, explica que o problema permeia diversos fatores importantes na vida das comunidades ribeirinhas. “As altas temperaturas têm acelerado a evaporação das fontes de água, reduzindo os níveis dos rios e privando esses moradores de seu principal meio de transporte. As mudanças climáticas também afetam a qualidade da água, tornando-a mais suscetível à contaminação e facilitando a escassez de água potável”. 

No Acre, por exemplo, moradores sofrem com a estiagem. “Não há água nas torneiras”, diz Maria, de 63 anos e moradora de Rio Branco. Hoje, muitas das casas são abastecidas por caminhões-pipa da Operação Estiagem, iniciada pela Defesa Civil do Rio Branco em julho e que este ano deve se estender até meados de dezembro. 

Em 2021, a operação atendia 10 comunidades, mas este ano já são pelo menos 30 – num momento em que o Rio Acre, que abastece a capital do Estado, chegou a bater no nível de 1,44 metro, apenas 19 cm acima da mínima histórica de 1,25 metro, registrada em outubro de 2022. Especialistas ainda observam que alguns dos principais rios amazônicos já estão em nível abaixo daquele registrado na mesma época em 2010 – ano da maior seca da história na Amazônia.

Na medição feita na quinta-feira (18), o nível do rio Negro, em Manaus, estava em 16,11 m. A mínima histórica registrada em 2010 foi 13,63 – mas nessa época daquele ano, o rio estava em 17,2 m. Ou seja, estava 50 cm acima do cenário atual.

Dados da Seduc-AM (Secretaria de Educação do Amazonas), apontam que a seca já atinge 355 estudantes de colégios públicos do estado. O setor industrial já avalia haver um aumento de 40% a 50% no custo do transporte de insumos e distribuição de produtos do Polo Industrial de Manaus, devido ao período de estiagem severa. Hoje, o serviço geológico brasileiro, sinaliza que essa é a segunda pior seca na região do Alto Solimões em dez anos.

“Essa situação envolve a inacessibilidade de algumas comunidades devido à incapacidade dos barcos de alcançá-las, o que acarreta riscos significativos de escassez de alimentos e dificulta a locomoção às escolas, uma vez que o transporte por via fluvial era a principal via utilizada anteriormente. A interrupção desse meio essencial representa não apenas um obstáculo à educação, mas também uma ameaça direta à segurança alimentar e ao bem-estar dessas comunidades”, explica o especialista. 

Nesta semana, o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), esteve em reunião em Brasília com os ministros da Integração e do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, e representantes de seis órgãos federais.

Após a reunião, foi anunciada a ampliação da ajuda humanitária à região, com o envio de itens como cestas básicas e água, além da intensificação do combate ao desmatamento e aos incêndios, principalmente no sul do Amazonas. O governo federal também anunciou a liberação de R$ 140 milhões para dragagem nos rios Madeira e Solimões, importantes vias de escoamento de cargas e produtos da região, inclusive da Zona Franca de Manaus.

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